OS MESTRES DO CANTE

Ao mestre Ermelindo Galinha.
É necessário recordar e homenagear os mestres do cante alentejano, como figuras cujos nomes ficarão para sempre ligados ao nosso cante e na nossa memória ficarão registados como figuras de referência.

Pianinho, pianinho, Sem a voz salientar! Quem não souber que não cante! Agora ... vozes ao ar!

Já bem longe dos tempos que teimosamente se pretendem reviver, podemos afirmar aqui com todo o brilhantismo que o nosso cante é, sem dúvida nenhuma, o elo mais forte do povo alentejano. E que ainda se mantém em tal estado de pureza que, por mais que custe (e custa), não foi deteriorado na sua forma e, portanto, o consideramos como o cantar mais genuíno e representativo do nosso Alentejo.

Toda esta boa forma do cante e do rigor interpretativo, salvo raras excepções, é fruto de uma escola que tem a sua “sala de aulas” no Alentejo, onde aprenderam os que se ausentaram e os que ainda permanecem. Por isso, todos os alentejanos têm o saber de cantar.

Notem o conteúdo poético desta cantiga: Esta noite nem m’eu deito/só o fim de ouvir cantar/gosto de ouvir bem feito/em certo particular (Da moda: Tira o Capotinho). É muito sugestiva a forma como ela demonstra o interesse que era então criado à volta do cante, mas também revela que era em festas ou nas feiras que os criadores de novas modas e de cantigas se apresentavam com os seus grupos, para se imporem e aonde os amantes do cante se deliciavam.

Para os novos cantadores que se preocupavam em seguir os mais velhos nos desempenhos destes, também apareciam cantigas sugestivas, como a que a seguir mencionamos: Muito gosto eu de estar/onde os bons cantadores estão/se eu nalgum ponto errar/os mestres me ensinarão. Isto prova que era dispensável aos cantadores com invejável estatuto o respeito que lhe era patenteado pelos mais novos.

Os mestres do cante: sendo para eles o nosso propósito de escrita, ocorre-nos a necessidade de os recordar e homenagear como figuras cujos nomes ficarão para sempre ligados ao nosso cante e na nossa memória ficarão registados como figuras de referência.

Hoje, socorremo-nos da “escola” de Cuba, fundamentada na alma daquele enorme cubense, o mestre António Luís Fialho, que fundou o Grupo Coral “Os Ceifeiros” de Cuba, em 1933, e a quem o Alentejo muito deve.

Com ele queremos também recordar todos os que com o mestre fizeram do grupo “Os Ceifeiros” de Cuba um ex-líbris do cante alentejano.

Um dos seus seguidores é o mestre Ermelindo Galinha, que orienta o Grupo Coral “Os Ceifeiros” de Cuba, e que diz de Luís Fialho, por palavras do sentir, como resposta a questões surgidas em conversas ocasionais:

- A forma de cantar dos Ceifeiros e dos restantes grupos de Cuba identifica o estilo à moda de Cuba, criado por António Luís Fialho.
- Foi um homem que dedicou toda a sua vida ao cante e se hoje o nome de Cuba é conhecido é através do cante e a ele é devido.
- Tudo o que sei do cante a ele o devo, até porque nasci “debaixo dos seus tectos” e logo fui influenciado.

Nos ensaios a que assistimos, sob a sua orientação, notámos este pormenor que nos impressionou: tal foi a disciplinadora mas não hostil voz do mestre na organização e escalonamento das vozes que ele atempadamente burilou, em ganho de tempo, individualizando com novos cantadores o ensinamento do estilo que fez questão de praticar ao longo dos anos, para melhor poder colocar as vozes no conjunto de que dispõe.

A postura do grupo em desfile, conhecidíssima pela sua forma lenta de caminhar, também é, nos ensaios, praticada até à exaustão. E ai se há enganos ...

Apelamos aos grupos corais, às autarquias e à Direcção Escolar do Concelho de Cuba para que criem estruturas vocacionadas para o ensino do cante aos mais jovens, onde os monitores sejam homens como o mestre Ermelindo Galinha.

Sugerimos ao Secretariado do Cante Alentejano que providencie a produção de um vídeo tipo, com os aspectos mais relevantes de ensaios, orientados por mestres de competência comprovada.

Será bom acautelar o futuro, utilizando os conhecimentos do passado!

Rosa, Maria Eduarda
Pereira, José Francisco
in: Jornal Diário do Alentejo, 3 de Julho de 1998

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