TRATADO DO CANTE - As Comidas
A
AÇORDA, de João Falcato
O
Alentejano, com bossa de aventureiro e navegador, senhor de pisada firme capaz
de abarcar o mundo, prendado com olhar aberto que não teme os longos horizontes,
não sai da sua terra. Se ela é generosa para ele, vive feliz. Se ela se lhe
mostra madrasta, curva a cabeça de filho sofredor. É que há entre ele e a sua
terra qualquer coisa de sólido e também de aliciante. A terra sua mãe, estendendo-lhe
generosamente o pão com que miga as suas sopas, as ervas com que as perfuma e o
azeite com que as aloira, escraviza-o no excesso do seu amor por ela. Cada sopa
diária de açorda é gota de mítica beberragem que prende o homem cada vez mais
ao seu solo.
Ó loira,
olorosa, reconfortante Açorda! Quem te soubera cantar!
(de
Elucidário do Alentejo)
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