TRATADO DO CANTE - Festas e Romarias:

"ROMARIAS


Pelas estradas poeirentas, ouve-se ao longe o alegre tilintar das guizeiras do gado que arrasta pachorrentamente os antigos carros de "Canudo", de mistura com o incessante buzinar dos automóveis e camionetas rápidas; uns e outros vão cheios de gente feliz e contente que, lançando ao ar cantigas alegres, parece dizer-nos: «Vamos p'ra festa, vamos p'ra festa!».
Uns vão cedo, antes do sol nado, para à vontade poderem escolher o lugar de bivaque donde melhor lhes seja dado admirar todos os números da romaria, desde a chegada dos pendões - ingénuos panos de Arraz para a fé dos nossos camponeses - até ao fogo luminoso e barulhento.
Outros vão mais tarde, aproveitando-se do progresso, afim de chegarem precisamente à hora da diversão que mais os interessa, festa de igreja, tourada ou feira.
E por aqueles campos, abrigados debaixo das oliveiras - símbolos da paz em que as azeitonas verdes põem uma nota de Esperança - os romeiros dormem, comem, dançam, cantam e divertem-se de mil e uma formas, sempre em paz - a índole do Alentejano - e na esperança de voltarem para o ano.
Pela noute velha, passada a festa, aí voltam os carros alentejanos, aos solavancos das suas molas... de azinho, embalando os romeiros que nos fugazes sonhos d'aquele dormir rápido, vêem festas deslumbrantes de luz e riqueza, e os automóveis e camionetas nas suas carreiras vertiginosas, lançando nuvens de poeira e fazendo dançar uma dança estranha - a última da romaria- aos que transporta e não conseguem sequer pelo sono.
E os grupos calados, farnéis vazios, pálpebras a fecharem-se, ao apearem-se derreados, parecem dizer aos infelizes que não foram à romaria: «Vimos da festa!»."

Rafael
Pinceladas rústicas
Brados do Alentejo de 27 de Setembro de 1931

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