TRATADO DO CANTE - Escrito:

"A CANTIGA


(...) 
Par o povo a cantiga é uma expressão de alegria, de tristeza, de sofrimento, de entusiasmo e de glória. Não há movimento popular em que não entre a cantiga, ou precedendo ou acompanhando, ou seguindo. Ordinariamente precedendo por que tem bravura, generosidade e entusiasmo o canto é fortificador, é o livre respiradoiro das almas abafadas. Os que cantam consolam-se, parece que a música quando sai dos lábios tem o poder de arrastar, para se dissiparem no ar, todas as tristezas do peito.

O povo sentiu isto quando inventou aquele adágio jovial: «quem canta seus males espanta».

Nas lutas populares ela ouve-se primeiro do que o rufar dos tambores; e depois não há luto ou triunfo na vida dos povos que ela não tenha deplorado ou celebrado. Alguém disse já que a canção tinha morrido; ora a canção não pode morrer porque é um dos instintos do homem.

(...)

Ainda que morresse como género literário, nunca morreria como influência e expressão popular.

Os tristes e os deserdados, os pobres, os oprimidos quando tudo lhes falta, o pão, o lume, o vestido, têm sempre no fundo da alma uma cantiga que os consola, que os aquece, que os alegra. E então a cantiga vale mais que todos os poemas!"

Lobato Adegas (Terra Nossa, nº. 3-1916)
in: "Cancioneiro Alentejano". Edição especial do Grémio Alentejano. 1938.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

TRATADO DO CANTE - Modas:

TRATADO DO CANTE - Destaque-se: