TRATADO DO CANTE - Votos:

O Cante, expressão monumental do Ser Alentejano.
Al-Zéi
AO CANTE DOS CEIFEIROS DE CUBA (75º Aniversário)
Declaração de votos (75):
a. (…) Em linha, à borda do trigo, distanciados seis metros uns dos outros, começaram a terrível faina da ceifa (…)[1]

 

01. que com nobreza de carácter dignifiquemos os Ceifeiros;
02. que o seu exemplo por demais vivido seja reposto demasiadamente;
03. que conste do nascer ao pôr do sol no eterno da nossa alma;
04. que no pão que comemos os entendamos;
05. que da sua árdua tarefa nos eleve ao silêncio melancólico do seu sentir;
06. que vá bem longe o seu relato;
07. que respeitosamente os admiremos;
b. “(...) - Vai chamar os Homens da ceifa. (...) Os Ceifeiros pareciam estar sozinhos; faziam um círculo (...) e iam desfiando quadras(...) A toada foi ecoando (...)”[2]
08. que ao romper da bela aurora se padeça;
09. que de ai solidão, solidão, nos confundamos;
10. que na barrinha do meu lenço nos apostemos;
11. que de quando abalei para os Açores nos glorifiquemos;
12. que da Margarida nos ensinem a pescar;
13. que quem há-de, senhor, quem há-de?;
14. que Portugal seja o nosso espaço;
15. que do ser Ser se alcance o ritmo certo;
c. “A terra dói-se. E tu canta, companheiro, a tua estrofe rebelde, à nascença de um rio! Não violes as gruas do silêncio, implantadas ao rés das choupanas dos zagais. Acende a tua voz de profeta, ergue novamente a tua mão, cheira, ao longe, o vulto das papoilas, mas canta. Estás no teu país Alentejano, e a tua voz é esforço, é esperança, é sangue, é poesia!”[3]
16. que seja a terra amada;
17. que a melhor melodia seja dedicada à nossa terra;
18. que no sabor da terra nos confundamos;
19. que o poeta escreva bem a terra para melhor ser cantada;
20. que passe muita água por baixo das pontes;
21. que as vozes ressoem;
22. que os silêncios sejam cumpridos;
23. que o Ser alentejano cante;
d. “(...) braço no braço/ a cantar/ pelos caminhos/ do sol,/ a voz enlaçam/ na voz/ misturando/ eu/ e nós.”[4]
24. que o grupo seja doce;
25. que as vozes se harmonizem;
26. que as modas sejam moda;
27. que o cante seja enlevo;
28. que os ouvintes apreciem;
29. que o som seja um ruído bom;
30. que no conjunto sejamos dignos;
e.”(...) Cantar é o seu destino! (...) Ó Príncipes da Melancolia (...)”[5]
31. que o cante tenha força criadora;
32. que a escola de cante seja forte;
33. que os exemplos de cante sejam soberbos;
34. que a tradição de cantar se mantenha forte e duradoira
35. que sejam sãos os requisitos do cante;
36. que lá longe sejam bem ouvidos;
37. que o resultado seja demonstrativo;
f. “(...) Lá dentro, como capítulo de monges, uma fila de homens sentados num banco, rígidos e quase hieráticos, arrastavam um entoado e magoado canto, tão repassado de acentos melancólicos, que mais parecia salmodiar que entreter profano. Eram os homens nas adegas cantando! (...)”[6]
38. que os locais de culto do cante sejam preservados;
39. que prespasse o sentir o cante como acontecia quando os homens se juntavam nas "vendas";
40. que aconteça sempre cante nas tabernas do Baixo Alentejo;
41. que a vila de Cuba mantenha as suas tabernas de forma a que se cante sempre e bem conforme o vem fazendo;
42. que a vontade se mantenha pura e nobre na defesa dos valores do cante e do seu património;
43. Que se beba um copo aos cantadores dos Ceifeiros de Cuba;
44. Que se beba outro copo ao Povo Cubense;
45. Que ainda se beba um copo à saúde do nosso cante;
g. “É assim o Alentejo que não vem de nenhum lado, que não vai para nenhum lado, «como um meio sem pontas». Tal é a definição de infinito dada por um filho analfabeto desta planície. É este «meio sem pontas» que vibra nos cantares alentejanos. Cantares de circunstância, a partida de um amigo, o adeus de um emigrante, a falta de chuva, que tomam forma quando meia dúzía de homens concertam as vozes e erguem uma catedral de sons. (...)”[7]
46. que o alentejano use sempre a capacidade de se identificar com o cante nas suas atitudes reflectindo-as nas letras das suas modas;
47. que se garanta sempre a genuinidade intrínseca do cante;
48. que a bandeira alentejana seja desfraldada ao sabor dos melhores cantes e dos melhores motivos;
49. que se reveja no grupo de cantadores a forma de ser alentejano;
50. que o Alentejo seja glorificado pela forma de o cantar;
51. que se fortaleçam os laços que ligam os alentejanos;
52. que na circunstância se alberguem os verdadeiros valores do cante;
53. que se erga a catedral dos sons do cante;
h.  Sendo o cante a grande paixão de qualquer alentejano que se preze. Não consigo descortinar até aonde é o Grupo Ceifeiros de Cuba o causador deste embevecimento.
54. que Cuba seja reconhecida aos  seus Ceifeiros;
55. que os Ceifeiros de Cuba sejam enormes nos grandes palcos;
56. que os cantadores dos Ceifeiros de Cuba sejam distintos;
57. que as modas dos Ceifeiros sejam sementes do porvir;
58. que no falsete das modas se regulamente a verdade do cante dos Ceifeiros;
59. que os pontos dos Ceifeiros sejam os provocadores de boas modas;
60. que quando cantam os Ceifeiros se viva por inteiro o cante;
i. “Hoje, socorremo-nos da “escola” de Cuba, fundamentada na alma daquele enorme cubense, o mestre António Luís Fialho, que fundou o Grupo Coral “Os Ceifeiros de Cuba”, em 1933, e a quem o Alentejo muito deve. Com ele queremos também recordar todos os que com o mestre fizeram do grupo “Os Ceifeiros de Cuba” um ex-libris do cante alentejano.”[8]
61. que se fomente a boa prática do cante nos mais novos;
62. que se reforce a ideia de “cantar à moda de Cuba”;
63. que se ensine o cante nas escolas de Cuba;
64. que se faça a escola do cante em Cuba;
65. que se procure na memória colectiva de Cuba e se identifiquem as melhores referências do cante;
66. que se reforce, na continuidade, o exercício de cantar;
67. Que os Ceifeiros de Cuba sejam sempre uma boa lição de cante;
j. Certezas não tenho. Mas considerando o percurso deste grupo muito provavelmente ficará como um dos maiores do Cante Alentejano para todo o sempre.
68. que o Alentejo seja ainda maior reconhecendo o cante como seu Património;
69. que o Alentejo seja ainda mais nobre aquém e além Tejo pelos seus majestosos cantares;
70. que o Alentejo seja ainda mais admirado quando se identifica no cante;
71. que o Alentejo seja ainda mais forte quando se entende a cantar;
72. que o Alentejo seja ainda mais belo na introdução das suas cantigas;
73. que o Alentejo seja ainda mais responsável na cadência das suas modas;
74. que o Alentejo seja ainda mais digno quando se revive no cante;
75. que o Alentejo seja ainda mais Alentejo quando Os Ceifeiros se põem a cantar.


Bem Hajam!
Junho de 2008
José Francisco Pereira





[1]ALMEIDA, Fialho de - Ceifeiros
[2] FONSECA, Manuel da – Cerromaior, “Coro de Ceifeiros”
[3] SILVA, Antunes da – Alentejo é sangue, in “Prece”
[4] MAÇARICO, Luís Filipe – do poema Polifonia, Beja 9/11/97
[5] BEIRÃO, Mário - Do texto O Canto Alentejano, publicado no Diário de Lisboa de 15-III-1952. Na ida a Lisboa dos ranchos do Baixo Alentejo, para cantarem na Casa do Alentejo e no Pavilhão dos Desportos.
[6] RIBEIRO, Manuel – A Batalha nas Sombras (1928).
[7] CORREIA, Natália – in Contos inéditos e crónicas de viagem, Parceria A. M. Pereira, 2005
[8] ROSA PEREIRA - “Os mestres do cante”, in Diário do Alentejo, 3 de Julho de 1998

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